sábado, 18 de agosto de 2012

Começou a luta...

Ouça e se inspire...


Começou a Luta Pachamad@s e é necessário nos armar, a partir de hoje começaremos nos alimentar e nos fortalecer para a LUTA.
Fiquem atentos nos materiais que serão publicados aqui no Blog.

O primeiro material de preparo para o 7º encontro são dois pequenos artigos sobre "Direitos Humanos e o socialismo do século XXI" de Jung Mo Sung.


Direitos Humanos e o socialismo do século XXI (I parte)


Jung Mo Sung
Diretor da Faculdade de Humanidades e Direito da Univ. Metodista de S. Paulo.
Adital
Franz Hinkelammert, no seu mais recente livro "Lo indispensable es inútil: hacia uma espiritualidad de la liberación” (Costa Rica, 2012), diz: "Se hoje dizemos que outro mundo é possível, se queremos uma sociedade alternativa, ou o socialismo no século XXI, então creio que é fundamental partir sempre dos direitos humanos. Os direitos humanos não são simples moralismo. O reconhecimento dos direitos humanos é mais bem a condição de possibilidade de uma sociedade alternativa e uma sociedade sustentável, a base de toda sociedade que podemos considerar que vale a pena sustentar.” (p. 96).Para entendermos o alcance dessa afirmação, precisamos ter em vista uma mudança fundamental na luta pelos direitos humanos no século XXI.
A luta pelos direitos humanos no século XX se deu fundamentalmente em oposição aos Estados autoritários ou totalitários que negavam os direitos individuais dos cidadãos através, por ex., de torturas e censuras. Na medida em que passamos por processos de democratização política, esse autoritarismo do Estado foi sendo controlado ou diminuído em quase todos os países da América Latina. Por isso, pode parecer a muitos que o discurso dos direitos humanos é algo ultrapassado, restrito hoje a grupos e lutas como Comissão Nacional da Verdade, "Tortura nunca mais” ou lutas contra violência contra minorias. (Não vou discutir aqui a tese de que os DH devem ser substituídos por Direito da Natureza)
Essa primeira impressão esconde um mecanismo perverso: hoje a violação dos direitos humanos é cometida não tanto ou somente pelo Estado autoritário, mas também e principalmente através dos mecanismos do mercado "livre”. Com a globalização neoliberal, o principal "agente” violador dos direitos humanos passou do Estado para o sistema de mercado livre. Por ex., as piores violações contra os direitos humanos na guerra do Iraque não foram cometidas pelo exército norte-americano, que estão sob as leis americanas e internacionais, mas por soldados e agentes profissionais contratados através de empresas privadas, que não estão sob as leis internacionais que colocam limites aos procedimentos desumanos na guerra.
A censura é outro exemplo. A principal forma de censura dos meios de comunicação no mundo hoje não é feita através de mecanismos mais "brutos” das ditaduras, mas de modo muito mais silencioso e sutil pela seleção das versões de notícias que estejam de acordo com os interesses dos conglomerados empresariais por detrás dos meios de comunicação. A censura é feita em nome da liberdade de imprensa.
E o direito fundamental à vida –direito que implica em direito ao emprego, saúde...de todos/as— é massivamente violado, não de modo direto, mas indireto. Estado autoritário mata diretamente, enquanto que o sistema neoliberal de mercado global não mata diretamente, o que faz é não permitir que os pobres vivam. Para assegurar, por ex, a sustentabilidade do sistema financeiro europeu e também global, impõe-se aos países como Grécia, Portugal e Espanha medidas duras que não permitem que milhões de trabalhadores pobres possam sobreviver. Há cálculos que indicam que na Rússia, no período de transição para "mercado livre”, morreram quase três milhões de pessoas por causas dos efeitos dessa liberalização.
Para o sistema neoliberal, o que consideramos indispensável, o direito à vida digna de todas as pessoas, é algo inútil e ineficiente porque implica em medidas que limitam a liberdade do mercado. A defesa do direito fundamental à vida de todos/as se dá hoje prioritariamente contra o sistema de mercado neoliberal que impõe sua liberdade de mercado e os direitos dos grandes conglomerados econômicos, "pessoas jurídicas”, sobre as populações de todo o mundo. Em termos da vida cotidiana, os direitos humanos foram substituídos por "direito do consumidor”, porque, no neoliberalismo, quem não é consumidor não é humano, portanto não possui direitos fundamentais.
[Jung Mo Sung, autor de "Sujeito e sociedades complexas” (Vozes). Twitter: @jungmosung].



Direitos Humanos e o socialismo do século XXI (II parte)

Jung Mo Sung
Diretor da Faculdade de Humanidades e Direito da Univ. Metodista de S. Paulo.
Adital

É da própria lógica de funcionamento de sistemas ou instituições sociais tratar o indivíduo humano como uma peça da sua engrenagem e, desta forma, valorizá-lo na medida em que cumpre com as exigências do próprio sistema. Quanto mais totalitário o sistema, mais o ser humano é reduzido à condição de elemento do sistema e nada mais. Em uma sociedade capitalista neoliberal, como afirmei no artigo anterior, "os direitos humanos foram substituídos por ‘direito do consumidor’, porque, no neoliberalismo, quem não é consumidor não é humano, portanto não possui direitos fundamentais”.
É claro que legalmente falando, mesmo um indivíduo totalmente excluído do mercado, um miserável, não deixar de ser considerado humano, mas na vida cotidiana real e nas dinâmicas sociais e econômicas ele não tem seus direitos humanos fundamentais reconhecidos e respeitados. O mercado, na cultura capitalista, passou a ser considerado a fonte da humanidade e, portanto, fonte dos direitos fundamentais.
Essa experiência cotidiana está tão internalizada na nossa cultura que, quando alguém se sente "menos gente”, deprimido ou "impuro”, uma das soluções mais procuradas é ira ao shopping fazer compras. É no contato direto com o que há de mais esplendoroso do mercado, as vitrines dos shoppings com objetos e marcas glamorosos, que o indivíduo se sente recuperando a humanidade perdida. No passado, as pessoas em situação semelhante iam a igrejas ou a lugares sagrados rezar ou realizar algum ritual porque, nessa cultura, a religião, o sistema religioso, era vista como a fonte da humanidade. Por isso, quem era ateu ou de outra religião que não a dominante era visto como um indivíduo carecendo de humanidade plena.
A luta pelos direitos humanos no século XX não foram somente lutas "políticas” contra Estado totalitário ou ditatorial (seja nos países capitalistas ou comunistas), eram e são fundamentalmente a afirmação da dignidade fundamental do ser humano anterior a qualquer instituição ou sistema social (sistema de mercado, Estado, Igreja,...). Portando, os direitos fundamentais de todo ser humano a vida digna e, por isso, a direitos como a moradia, saúde, educação, ao trabalho remunerado, liberdade de expressão, de ir e vir são anteriores e independentes do lugar que a pessoa ocupa no sistema social dominante.
Não é pertença a uma religião ou igreja que dá dignidade ou valor a uma pessoa. Em termos de sistema religioso, a afirmação dos direitos humanos se fundamenta no princípio de que Deus não faz distinção entre pessoas, não importando se é "judeu ou gentio” (sistema político-religioso), homem ou mulher (sistema de parentesco e de gênero), livre ou escravo (sistema de propriedade/economia) e outras distinções e hierarquias sociais que temos. Em uma linguagem teológica cristã, poderíamos dizer que os direitos humanos se fundam na graça de Deus (Deus não impõe nenhuma condição humana, social ou religiosa para amar a todos).
Assim também, não é pertença ao sistema de mercado e a capacidade de consumo que dá fundamento aos direitos humanos na sociedade capitalista; nem ser cidadão legalmente documentado no mundo globalizado que se fecha aos fluxos imigratórios de trabalhadores buscando sobrevivência; ou então ser leal e obediente ao Estado socialista em países governados por partidos comunistas.
A luta por um "outro mundo possível” não pode ser por um tipo de sistema político-econômico alternativo definido como absoluto ou como critério último para as decisões concretas. Pois, se o sistema ou instituição é tomado como critério último, a dignidade do ser humano fica condicionada a pertença e à lógica dessa instituição ou sistema e se nega a anterioridade da dignidade e dos direitos humanos em relação a todo e qualquer sistema social. Não há possibilidade de realização dos direitos humanos sem sistemas e instituições sociais, mas devemos garantir que esses direitos sejam vistos como anteriores a sistemas. Se não, cairemos em totalitarismo, seja do sistema de mercado total, seja do Estado socialista totalitário ou de qualquer outro sistema político-social ainda a inventar. (a continuar)
[Jung Mo Sung. Autor, com Hugo Assmann, do livro "Deus em nós: o reinado de Deus que acontece no amor solidário aos pobres”, Paulus. Twitter: @jungmosung)].

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O Projeto "Eu Sou + 7 x7" é um curso de formação de lideranças jovens, historicamente voltado para dar suporte ao trabalho da Pastoral da Juventude. Este curso é oferecido pelo IPJ às coordenadoras/es e animadores/as do trabalho pastoral e social. O número é 50 (cinquenta jovens lideranças) e o tempo é 7 (sete encontros bimestrais) num ciclo de um ano que abordam temas ligados à Formação Integral. Este projeto teve início na PJ da diocese de São Miguel Paulista no ano de 1997 onde aconteceram suas três primeiras edições (Jubileu, Pentecostes e Kairós). Em 2007 o IPJ retomou tal proposta de formação, reformulou a estrutura do projeto, ampliou sua região de abrangência e firmou parceria com a DKA da Áustria. O IPJ já realizou duas edições do projeto (Ruah e Êxodos)e, atualmente, desenvolve mais uma com o Grupo Pachamama. Esta sexta edição do Projeto "Eu Sou+7x7" não envolve apenas jovens da Pastoral da Juventude, mas também de movimento cultural, ecológico e de diferentes denominações religiosas.